terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A responsabilidade social na formação de atletas para o futebol – os princípios

CAROS AMIGOS,

Confiram artigo Publico no site CIDADE DO FUTEBOL por GERALDO RICARDO HRUSCHKA CAMPESTRI:


Os clubes, como organizações que são, precisam assumir formalmente seus papéis e princípios quanto ao processo de desenvolvimento dos talentos

Geraldo Ricardo Hruschka Campestrini

A partir deste texto, delinear-se-á cada item da "Carta Internacional de Responsabilidade Social para a Formação de Praticantes no Futebol" (CIRESP-FUTE 2009) proposta por Campestrini e Cunha e apresentada anteriormente no portal Universidade do Futebol.

Esta discussão e reflexão sobre a responsabilidade social na formação de atletas para o futebol é deveras pertinente e é endossada pelo presidente da entidade máxima do futebol, Sr. Joseph Blatter, que proferiu discurso recente no Congresso anual da Fifa realizado em Nassau-Bahamas no começo de junho com os seguintes dizeres sobre a proteção aos menores: "It is our duty to the youth of the world to protect young players. We must do it together. Stop the slavery of these young players!".

A preocupação com aquilo que se classifica como a "escravização moderna" realizada pelos entes envolvidos com o futebol é o tema a ser aprofundado para novas considerações e atitudes por parte de clubes e entidades de administração da modalidade.

Neste escopo, a CIRESP-FUTE 2009, calcada nos princípios relacionados a proteção aos menores (crianças e adolescentes), participantes de processos de formação de atletas para o futebol, inicia na primeira parte de três a falar sobre os princípios fundamentais que devem ser considerados pelas organizações do futebol dentro deste contexto.

O primeiro fala sobre a "Carta de Princípios", conforme segue:
I. Carta de Princípios:

(a) Espírito Desportivo/Fair Play: assumir um compromisso formal quanto ao cumprimento dos princípios estabelecidos pelo Fair Play Code (Código do Espírito Desportivo), da Fifa;
(b) Ética: firmar, de forma clara, concisa e transparente, uma carta de princípios éticos que se incorporem na estrutura organizacional do clube a fim de regulamentar a atuação de todos os envolvidos, dentro do Espírito da Responsabilidade Social.
Em pesquisa recente sobre a conduta de clubes de futebol na formação de atletas, cuja motivou a criação da CIRESP-FUTE 2009, realizada com 15 clubes do sul e sudeste do Brasil**, constatou-se que no discurso os mesmos afirmam praticar conceitos relacionados a princípios morais e éticos. Mas quando questionados sobre procedimentos formais, a fim de se identificar a inserção dos mesmos na cultura organizacional do clube, apenas o Grêmio de Football Porto-Alegrense apresenta um em seu website oficial.

No que diz respeito a código de conduta que delimite as diretrizes do departamento de formação, apenas São Paulo Futebol Clube, Grêmio de Football Porto-Alegrense e Sport Club Corinthians Paulista o entregaram para este pesquisador.

Tais resultados apontam para a existência de um ambiente ainda informal de trabalho dentro dos clubes brasileiros ou pouco transparente, motivo pelo qual se propõe a estandardização de processos e redação formal de uma carta de princípios, a ser cumprida integralmente pelos colaboradores do clube.

No que diz respeito ao Fair Play Code, instituído pela Fifa, observou-se a existência de certo desconhecimento sobre o mesmo, que apresenta um texto muito mais abrangente que a simples questão dos valores gerais do desporto e o respeito perante os adversários, imensamente divulgados pelos meios de comunicação social. O texto aprofunda temas relacionados ao combate à violência, o combate ao racismo, a honra aos princípios do futebol e o combate ao uso de drogas por parte dos atletas.

A responsabilidade social e o futebol

Segundo Bento (2004), quando fala sobre o “princípio do fair play”, introduz a temática afirmando que “o desporto é parte integrante da sociedade e, por isso, subordina-se ao sistema de normas e valores nela predominantes. Ou seja, aparentemente não há valores específicos do desporto, diferentes dos valores vigentes no contexto social”. Neste campo, continua com uma reflexão de demagogia que a sociedade faz sobre o fair play, quando a mesma não adota tais princípios na prática comum das relações comunitárias.

No entanto, Pires (1998) exemplifica a situação de protecionismo que se dá a certas atitudes no esporte e que são condenáveis na realidade do ambiente empresarial: operações como a criação de monopólios na produção de matérias-primas, que inviabilizam empresas de menor porte e impedem o desenvolvimento da livre concorrência (propalada base do sistema liberal/neoliberal), parecem ser muito mais condenáveis, do ponto de vista moral, do que a “catimba” de um atleta que consegue, através de encenações, a expulsão de um adversário, o que enfraquece a outra equipe em benefício da sua (Pires, 1998).

Por esta reflexão, muitas vezes se aceita muita coisa em um jogo de futebol que não seria admitida no cotidiano social. Assim, o Fair Play Code nasce da preocupação da Fifa em transmitir para o mundo uma visão melhor do futebol, ao delimitar princípios norteadores em termos desportivos, éticos e morais da modalidade. Por este motivo, a CIRESP-FUTE 2009 sugere a assunção de compromisso formal sobre o Fair Play Code como meio educacional para os atletas em formação e consequente aplicabilidade quando chegarem ao profissionalismo, além de possuir reflexo sobre o comportamento como cidadão.

Já o Código de Ética, que pode aparecer em documento único juntamente com os dispositivos cumpridores do Fair Play Code, deve abranger o relacionamento entre conselheiros, sócios, funcionários, fornecedores e demais partes interessadas, além de definir responsabilidades sociais e ambientais. A divulgação entre seus diversos stakeholders desta carta de princípios éticos é um dos alicerces para o cumprimento deste quesito, com base nos ideais de responsabilidade social corporativa.

Na definição de critérios para a qualificação de empresas e organizações quanto a sua responsabilidade social, a apresentação de um Código de Ética (ou conduta) é fator fundamental para ser considerado um bom cidadão corporativo. Este pré-requisito aparece nos indicadores do Instituto Ethos, da Bovespa, do Dow Jones Susteinability Index, do FTSE4 Good e em inúmeras referências de autores respeitados."Códigos de conduta estabelecem e explicam os princípios nos quais uma organização ou um profissional atua. Está implícito em qualquer código de conduta os valores organizacionais/institucionais que podem ajudar os gestores e empregados na solução de problemas relacionados com a questão ética. Códigos de conduta servem como suporte para que os empregados atuem de maneira positiva (...) se for bem feito, os códigos de conduta podem ajudar a criar um clima ético dentro da organização". (Crosset e Hums, 2005).

Em resumo: os clubes, como organizações que são, precisam assumir formalmente seus papéis e princípios quanto a formação dos atletas. Não é possível admitir que as tomadas de decisão em campo tão importante fique na total dependência dos valores e princípios individuais do gestor e das pessoas envolvidas (treinadores, preparadores físico, fisiologistas e outros). A questão dos princípios é algo muito maior e deve respeitar a cultura histórica do clube e sua evolução ao longo do tempo.

No próximo texto trataremos da transparência e o balanço social.* Geraldo Ricardo H. Campestrini é mestre em Gestão do Desporto pela Faculdade de Motricidade Humana; Bolsista Fifa (“Havelange Scholarship” – CIES/FIFA) e professor da Universidade da Região de Joinville (UNIVILLE).

** Realizada com os Coordenadores do Departamento de Formação de: Grêmio de Football Porto-Alegrense, Sport Club Internacional, Paraná Clube, Clube Atlético Paranaense, Coritiba Football Club, São Paulo Futebol Clube, Sport Club Corinthians Paulista, Sociedade Esportiva Palmeiras, Cruzeiro Esporte Clube, Clube Atlético Mineiro, Clube de Regatas Vasco da Gama, Botafogo de Futebol e Regatas e Fluminense Football Club. Santos Futebol Clube e Clube de Regatas do Flamengo não receberam este pesquisador para a aplicação da entrevista.
Bibliografia
BENTO, Jorge Olímpio. (2004). Desporto: discurso e substância. Porto: Editora Campo das Letras.
CAMPESTRINI, Geraldo. (2009). A responsabilidade social na formação de praticantes para o futebol: análise do processo de formação em clubes brasileiros. Dissertação de Mestrado em Gestão do Desporto da Faculdade de Motricidade Humana de Lisboa, Portugal.
CROSSET, Todd W.; HUMS, Mary A. (2005). Chapter 6: ethical principles applied to sport management. In: Principles and practice of sport management. Organized by: MASTERALEXIS, Lisa Pike; BARR, Carol A.; HUMS, Mary A. 2. ed. Mississauga: Jones and Barlett Publishers.
PIRES, Giovani de Lorenzi. (1998). Breve introdução ao estudo dos processos de apropriação social do fenômeno esporte. Revista da Educação Física/UEM 9 (1): 25-34.
FONTE: CIDADE DO FUTEBOL

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